Atrás das grades há exatos três meses e um dia, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua liberdade (em caráter liminar) ou a manutenção de sua prisão viraram motivo para uma queda de braço entre magistrados da primeira e da segunda instância neste domingo.

Tudo começou quando o desembargador Rogério Favreto, plantonista neste final de semana do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF4), determinou a soltura do petista ao acolher em caráter liminar o pedido de habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente na última sexta-feira (6).

Uma hora depois, o juiz Sergio Moro, que está de férias, se negou a cumprir a decisão afirmando que Favreto – que está uma instância acima da dele – não tinha competência para tomar essa decisão. A partir daí, mais duelos. Favreto voltou a insistir na prisão para, pouco tempo depois, ver sua decisão anulada pelo relator da Lava Jato no TRF4, João Pedro Gebran Neto.

Às 16h04 deste domingo, o desembargador de plantão publicou novo despacho reafirmando a soltura do petista sob a alegação de que um fato novo está em jogo e de que, enquanto durar o plantão deste final de semana, é ele quem deve tomar uma decisão sobre o assunto.

Para o jurista Gustavo Badaró, professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP), o Supremo Tribunal de Justiça ou o Supremo Tribunal Federal são os únicos capazes de um basta a esse vaivém — que, na visão dele, não deve ter um fim tão cedo. “Perante esse impasse, o melhor caminho seria uma reclamação da Procuradoria-Geral da República ao STF”, diz o jursita.

Há pouco, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo, se limitou a dizer que a Justiça deve ser impessoal e que os “órgãos judiciários competentes de cada região devem atuar para garantir que a resposta judicial seja oferecida com rapidez e sem quebra da hierarquia”.

Sucessão de erros
Na visão de Badaró, a confusão jurídica em torno da liberdade de Lula neste domingo é resultado de uma sucessão de lógicas e argumentos errados. Segundo ele, Favreto só teria autoridade para decidir sobre a liberdade de Lula durante seu plantão se fosse apresentado um fato novo “juridicamente relevante”. Para ele, o fato do petista ser pré-candidato à Presidência não se enquadraria nesse critério — essa opinião, contudo, não é ponto pacífico entre os juristas ouvidos por EXAME nesta tarde.

“Se fosse assim, qualquer pessoa que estiver presa poderia alegar ser pré-candidato para ter sua condição revista pela Justiça”, afirma. Favreto, em entrevista à Rádio Guaíba no final desta tarde, afirmou que cada caso concreto deve ser analisado individualmente e que “o direito político não pode ser suprimido enquanto o processo não tiver transitado em julgado”.

As reações de Moro e de Gebran Neto, na opinião de Badaró, também foram arbitrárias. Segundo o jurista, mesmo se o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba não estivesse de férias e fosse o destinatário da decisão, caberia a ele apenas cumprir a ordem já que está um grau abaixo de Favreto.

Quanto a Gebran Neto, segundo Badaró, já que ele é o juiz natural do processo, bastaria esperar o fim do plantão judiciário para revogar (ou manter) a decisão do colega de corte. A lógica, de acordo com o especialista, é que, durante o plantão judiciário, o juiz reponsável pelos casos é aquele que está de plantão. E um caso não pode ter dois juízes ao mesmo tempo. Nesse sentido, o adiantamento de Gebran soa “estranho” e “deu no que deu: uma briga de forças”, afirma o especialista.

E o presidente do TRF4?
O presidente do TRF4, Thompson Flores, segundo Badaró, não tem poder jurídico para revogar as decisões anteriores. A ele, restaria apenas tentar negociar com os dois desembargadores para encontrar um caminho plausível para resolver o impasse.

 

Fonte: Exame

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