Quase R$ 870 mil em lonas com impressão digital; cerca de R$ 612 mil em camisetas personalizadas; R$ 421 mil em tecido sublimado, que pouca gente sabe o que é; R$ 227 mil em troféu feito em acrílico. Não, não é para erguer acampamento de colônia de férias. Essa é a intenção de compras do governo de Josemira Gadelha, em Canaã dos Carajás, que busca uma empresa que forneça material gráfico a fim de atender a exigências da Fundação Municipal de Cultura, Esporte e Lazer (Funcel), autarquia da Terra Prometida.
Na semana passada, a fundação, sob comando da prefeita, lançou um pregão eletrônico (veja aqui https://www.tcm.pa.gov.br/mural-de-licitacoes/licitacoes/ficha/4112020#licitacao) para registrar preços de, pelo menos, 26 itens que totalizam R$ 3,298 milhões. Pelo valor, vê-se de cara a prioridade do governo local: esbanjar. Entre as curiosidades do pacote, além das já citadas no início desta matéria, está a intenção de aquisição de 10.724 medalhas em acrílico, ao custo de R$ 139 mil.
Nas 71 páginas do edital do processo enviado ao Mural de Licitações do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (TCM-PA) não há uma linha sequer em que o governo de Canaã dos Carajás justifique a necessidade de tamanha contratação.
Mas, em estudo técnico preliminar encaminhado ao Portal Nacional de Compras Públicas (PNCP), o governo local diz que “a necessidade de contratar serviços de fornecimento de material gráfico está associada à demanda por uma solução prática e temporária própria da realização dos eventos e projetos”, de modo a responder a “requisitos específicos, contribuindo para a eficiência” na realização dos tais eventos e “garantindo uma experiência positiva para os participantes”.
Em texto muito confuso, o governo de Canaã alega ainda que a aquisição da grande quantidade de material gráfico reflete o compromisso da administração municipal em transparência na aplicação dos recursos públicos, bem como a “inclusão social por meio do acesso à cultura e ao esporte”, com “engajamento da população em ações promovidas pela autarquia”.
25 mil na pobreza
A Prefeitura de Canaã dos Carajás foi, em 2024, uma das 70 mais ricas do Brasil, com arrecadação em dinheiro vivo — já livre de deduções — da ordem de R$ 1,952 bilhão. Para este ano, apenas o orçamento da Funcel é de R$ 45,743 milhões, maior, por exemplo, que a arrecadação inteira do município de Bannach, no sul do Pará.
Mas essa riqueza da Terra Prometida não é para todos. No final de semana, o portal Papo Carajás revelou que, segundo dados deste mês do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), o município de Canaã dos Carajás contabiliza 25 mil pessoas em situação de pobreza (veja aqui https://papocarajas.com/governo-josemira-quer-torrar-quase-r-4-milhoes-em-organizacao-de-festival-gastronomico/). Desse total, 12.600 canaenses sobrevivem com entre meio e um salário mínimo, o que é estarrecedor.
Enquanto a prefeita Josemira Gadelha abre a guarda para torrar R$ 3,298 milhões em material gráfico, o programa continuado “Renda Cidadã” tem dotação orçamentária inicial de apenas R$ 2,203 milhões para uso durante 2025 e o programa “Canaã Enfrentando a Pobreza”, também com duração anual, tem somente R$ 4,462 milhões de dotação. O combate à pobreza não parece ser urgência na terra que emana pão, leite, mel e licitações milionárias.
Josemira, diga-se de passagem, é uma gestora considerada “top de linha”, com pouco trabalho dado a órgãos de fiscalização, mas precisa abrir os olhos para o que realmente precisa ser prioridade para desenvolver Canaã e tirar seus muitos milhares de cidadãos da linha da pobreza.