O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal em Altamira que execute multa contra a Norte Energia SA, operadora da usina de Belo Monte, no Pará, pelo descumprimento de um acordo feito com manifestantes indígenas durante a ocupação dos canteiros de obras da hidrelétrica em outubro de 2012. Ao descumprir o acordo, a empresa também desobedeceu o licenciamento ambiental do empreendimento.

O acordo previa a construção das bases de proteção territorial para evitar invasões de terras indígenas, obrigação que já constava do licenciamento ambiental diante da previsão, nos estudos de impacto, de forte pressão de invasores nos territórios. A desobediência da Norte Energia aos termos do licenciamento e do acordo perdura até hoje e a região tem as duas terras indígenas mais invadidas e desmatadas do país: Cachoeira Seca e Ituna Itatá, ambas sem a proteção territorial.

A manifestação em 2012 foi uma das maiores dos povos indígenas pelo descumprimento das condicionantes do licenciamento ambiental e paralisou as obras da usina. A pedido do MPF, a Justiça Federal promoveu uma audiência de conciliação dentro dos canteiros, nos dias 16 e 17 de outubro daquele ano, quando os índios concordaram em desmobilizar o protesto diante da assinatura, pela Norte Energia, do acordo para construir 11 bases de proteção territorial, das quais apenas oito foram entregues.

Em fevereiro de 2013, diante da inação da empresa, a Justiça determinou multa diária de R$ 500 mil, caso seguisse adiando o cumprimento do acordo. Como até hoje não construiu as bases de proteção nas terras indígenas Ituna Itatá e Cachoeira Seca, o MPF calculou a dívida da Norte Energia em R$ 1,3 bilhão, que devem ser depositados em um fundo judicial a ser administrado pelos povos indígenas e utilizado integralmente para gestão e proteção dos territórios indígenas afetados pela usina.

A multa devida pela Norte Energia, no entendimento do MPF, diz respeito às bases de proteção que nunca foram construídas e também às que foram construídas com atraso, porque as ações de combate a invasões deveriam ter sido prévias a construção de Belo Monte mas com a entrega dos postos de vigilância apenas em 2016, os povos atingidos pela usina sofreram severos danos com invasões, grilagem e desmatamento eu seus territórios.

“Em realidade, a não implementação dessas bases é da ordem do impagável. Tanto ao guerreiro indígena, quanto aos seus territórios”, diz o MPF na petição enviada à Justiça. As terras indígenas Cachoeira Seca e Ituna Itatá, onde até hoje não existe nenhum posto de vigilância contra invasores, figuram hoje como as áreas mais desmatadas da Amazônia brasileira.

Na Ituna Itatá, área reservada para povos isolados, os invasores lotearam 95% do território por meio de cadastros ambientais rurais fraudulentos. Na terra Cachoeira Seca, onde vivem indígenas de recente contato, a proximidade com a rodovia Transamazônica provoca taxas de desmatamento recorde. Foram quase 8 mil hectares de florestas devastados em 2019.

O MPF ressalta no pedido que “se trata de obrigação da maior relevância”, porque a não implementação de unidades de proteção territorial “tornou inócuos programas indispensáveis à viabilidade da obra da UHE Belo Monte, permitindo uma vulnerabilidade não aceitável das terras indígenas, sendo hoje fato notório que a maioria dos problemas graves atuais no Médio Xingu se observam pela falta de proteção territorial”.

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